28 outubro 2007

O paradoxo (II)

A Cidade de Lisboa possui três importantes obstáculos que impedem uma deslocação automóvel fluída de Norte para Sul e vice-versa.
O primeiro desses obstáculos é a linha férrea de cintura. Quem a pretende atravessar só o consegue fazer em cerca de "meia dúzia" de locais: Sete Rios, Av. das Forças Armadas, novo túnel do Bairro do Rego (junto ao Hospital Curry Cabral), Av. 5 de Outubro, Av. da República, Av. de Roma, Av. Almirante Gago Coutinho, Olaias (viaduto) e Estrada de Chelas. Tudo locais bem congestionados, como sabemos.
O segundo obstáculo chama-se Segunda Circular. O seu atravessamento é difícil por estar limitado também a "meia dúzia" de locais: Radial de Benfica, Av. Conde de Almoster, Fonte Nova, Av. Lusíada, túnel de acesso ao Colombo e a Carnide (e futuramente à CRIL), Estrada da Luz, Eixo Norte Sul, Campo Grande, Calvanas e Rotunda do Relógio. Tudo sítios simpáticos em hora de ponta! (A Segunda Circular é também um obstáculo para quem se desloca de Este para Oeste e vice-versa.)
O terceiro obstáculo, porventura o mais complexo, remete para as serras que separam Odivelas e Loures de Lisboa. O seu atravessamento faz-se essencialmente através da Auto-estrada do Norte (A1), da Calçada de Carriche e do novíssimo troço do Eixo Norte-Sul. Existem ainda outras estradas (Frielas-Unhos, Serra da Luz, etc.) com reduzida capacidade de carga, que são utilizadas fundamentalmente por trânsito de natureza mais local e para deslocações mais curtas (por exemplo, Odivelas-Telheiras).
Já aqui referi que o Eixo Norte-Sul pouco adiantou em termos de descongestionamento da Calçada de Carriche. Não é muito difícil perceber porquê. Nos concelhos de Loures, Odivelas, Mafra e Vila Franca de Xira vivem 545 mil almas, mais 25 mil do que na Cidade de Lisboa (é sempre bom lembrar...). Muitas dessas pessoas trabalham em Lisboa e deslocam-se de carro, por não terem alternativa eficaz. Uma parte de quem entrava em Lisboa pela A1/Segunda Circular passou a fazê-lo pelo Eixo Norte-Sul. Por isso, a Segunda Circular aliviou ligeiramente. No entanto, quem continua a subir a Calçada de Carriche passou a ter a concorrência, antes inexistente, daqueles que estão a utilizar o Eixo Norte-Sul como alternativa à Segunda Circular.
Adicionalmente, o acesso ao Eixo Norte-Sul para quem sobe a dita calçada passou a ter um duplo estrangulamento: logo quando se sai da Av. Padre Cruz (uma faixa de rodagem em vez das duas que existiam anteriormente) e uns metros mais à frente, antes de se entrar no Eixo Norte-Sul (duas faixas de rodagem que passam a uma faixa de aceleração curta e perigosa). Por último, a própria Padre Cruz está também muito mais congestionada em direcção ao Campo Grande, provavelmente devido aos radares e também ao estrangulamento que foi recentemente criado no acesso à Segunda Circular no sentido do Aeroporto.
Tenho muitas dúvidas se alguma vez a Calçada de Carriche vai descongestionar significativamente. Todos os obstáculos acima referidos assim o determinam. E também a pressão construtiva: é sempre bom lembrar que as Colinas do Cruzeiro são uma pequena cidade para cerca de 10 a 15 mil pessoas. Ou que "As Villas" (Urbanização Mira Lisboa, entre a Ramada e Santo António dos Cavaleiros) vai ser também uma simpática cidade "só" para 6 mil pessoas. Ou ainda que o Concelho de Mafra não pára de crescer, tendo apresentado um crescimento de "apenas" 10 mil habitantes entre 2001 e 2005 (taxa de crescimento médio anual de 4,3%, a mais elevada da AML Norte).
Contudo, também é verdade que, se a abertura do troço final do Eixo Norte-Sul tivesse sido complementada com a entrada em serviço de outras vias importantes para tornar as ditas serras mais permeáveis, a Calçada de Carriche provavelmente não estaria a viver dias tão difíceis como os últimos. Estou-me a referir, em particular, à Av. Santos e Castro, que está parcialmente construída e que permitirá ligar o nó da Ameixoeira do Eixo Norte-Sul à Segunda Circular, na zona das Calvanas. Estou também a pensar no futuro Eixo Central da Alta de Lisboa - uma grande avenida com a mesma orientação da Av. da Liberdade e que a SGAL pretende que venha a ser uma nova centralidade de Lisboa. Algo paradoxalmente, esse suposto símbolo daquilo que já foi em tempos a Musgueira não passa de uma miragem. Esses dois eixos são, de facto, fundamentais para descongestionar a Av. Padre Cruz, apesar de ser também bom lembrar que a Alta de Lisboa será, no horizonte do projecto (i.e., em 2015), uma cidadezita com "apenas" 60 mil habitantes, ou seja, uma espécie de Évora ou Faro plantada entre a Segunda Circular, a Padre Cruz, o Aeroporto (ou o que futuro lhe destinar) e Odivelas.
Tenho alguma esperança que os futuros acessos da CRIL a Carnide/Centro Colombo/Segunda Circular (via Alfornelos) possam ajudar a "nossa" calçada. No entanto, também o futuro não é muito promissor para estes lados. A Radial da Pontinha / IC16 vai ser prolongada em direcção a Sintra, tendo em vista descongestionar o IC19. Por outro lado, junto ao nó do IC16 com a CRIL está a ser construído aquele que será o maior centro comercial de Portugal (Dolce Vita Tejo). Só não vê quem não quer ver que está em formação uma nova centralidade na Grande Lisboa, na confluência dos concelhos de Lisboa, Odivelas e Amadora (veja-se o novo Hospital da Luz).
Ora, Odivelas só ficará menos encravada face a Lisboa se a Serra for, de facto, "partida". Talvez não fosse má ideia começar-se a pensar num túnel que permitisse ligar o nó do Odivelas Parque a Telheiras...

21 outubro 2007

A cidade radiosa (IX)



A "Cidade Radiosa" está de volta! Hoje vou falar de um dos edifícios mais emblemáticos e interessantes de Odivelas, conhecido localmente por "Hotelcar".
Trata-se de um grande bloco de apartamentos, composto por quatro edifícios independentes assentes sobre pilotis e acedidos por um terraço-rua. Este último desenvolve-se sobre um embasamento com garagens e é servido por duas escadas que permitem passar do espaço público (a rua propriamente dita) para o espaço semi-público formado pelo citado terraço, onde existem também algumas lojas. O edifício "Hotelcar" possui ainda outro traços arquitectónicos eminentemente modernos, nomeadamente, uma fachada com um tratamento algo livre e cobertura com terraços-jardim.
Apesar das marquises que o descaracterizam parcialmente, o edifício em estudo mantém aquela pose fascinante dos grandes blocos que dominam a paisagem e que permitem uma certa permissividade entre os espaços públicos e os espaços privados de uso público. Localiza-se, aliás, num local de grande simbolismo para a Cidade de Odivelas: a fronteira entre um espaço urbano mais tradicional, de avenidas e quarteirões, e outro mais moderno, de blocos e torres dispostos de forma mais errática ao longo de espaços que deveriam ser mais verdes.



É difícil não associar o bloco "Hotelcar" a uma linha (muito interessante!) de edifícios que se construíram essencialmente nas décadas de 60 e 70 e cuja fonte de inspiração é, pelo menos parcialmente, o Pavilhão Suíço da Cidade Universitária de Paris (1930-33), de Le Corbusier e (do seu primo) Pierre Jeanneret, bem como as grandes unidades de habitação também de Le Corbusier (Marselha, 1945-52, e seguintes).
Em Lisboa, essas obras inspiraram importantes edifícios como o Bloco das Águas Livres (às Amoreiras), as unidades de habitação social de Olivais Norte, os blocos da Av. Infante Santo, o (impressionante) bloco da Rua Açores (bem perto da Embaixada da Rússia, junto à Av. Duque d'Ávila) ou alguns edifícios construídos na cercania daquele que é o grande local de culto de todos os que gostam da estética moderna e internacional: a Fundação Calouste Gulbenkian.

16 outubro 2007

O paradoxo (I)

Os primeiros dias de serviço do troço final do Eixo Norte-Sul parecem revelar um estranho paradoxo: a abertura de uma nova via de grande capacidade em Lisboa, em vez de descongestionar, congestiona - nomeadamente, a Calçada de Carriche, a Av. Padre Cruz, o Campo Grande e Telheiras.
Grande parte do problema está no impasse em que se encontra a Alta de Lisboa. Como tarefa preparatória de um debate que vamos desenvolver ao longos dos próximos dias, sugiro a leitura do excelente "post" Uma Mudança de Paradigma, inserido no muito interessante blogue Viver na Alta de Lisboa (o Pedro que o assina não sou eu).
Até já.

14 outubro 2007

O Jardim da Música

Não vou falar ainda sobre o grande acontecimento da última semana: a abertura do troço final do Eixo Norte-Sul (IP7), entre a Av. Padre Cruz e o Túnel do Grilo. A razão é simples: na quinta e na sexta-feira, a Calçada de Carriche mostrou-se, algo paradoxalmente, mais congestionada do que é habitual. Provavelmente, muitos odivelenses ainda não conhecem a nova alternativa de entrada (e saída) em Lisboa, pelo que é cedo para se fazer um balanço.
Se me permitem, vou falar antes de uma descoberta que fiz, também na semana passada, na revista Arquitecturas (n.º 29, edição de Outubro de 2007). Trata-se de um projecto que promete ser uma das grandes bandeiras do actual executivo camarário nas eleições de 2009: o Jardim da Música, a construir no actual vazio urbano (um tema muito em moda) entre os Paços do Concelho, o novo Centro de Exposições e a futura Casa da Juventude, ou seja, no terreno do antigo campo de jogos do Odivelas Futebol Clube.
De acordo com o artigo publicado nessa revista, trata-se de um projecto da autoria do arquitecto paisagista Jorge Cancela, do atelier Biodesign, que "promete ser uma alavanca para a reabilitação urbana de Odivelas". Pretende-se criar um "espaço verde urbano" e já não uma praça com estacionamento subterrâneo (como o anterior executivo pretendia) que se venha a assumir como "um ponto de descompressão e de encontro de pessoas e de gerações, com várias valências".
Ainda de acordo com esse artigo, o conceito do futuro jardim "consiste em pegar em elementos da composição do jardim português tradicional e adaptá-los à realidade urbana". O seu desenho será fluído e permitirá passar, "com naturalidade, do pomar até ao campo de aromáticas, passando pelo olival, o prado e a mata". Terá uma praça com um anfiteatro ao ar livre bem como um banco corrido com 80 metros de comprimento coberto por uma pérgola. O poço e a nora já existentes serão preservados. Será construído um caminho de água culminando num espelho de água com funções "micro-climáticas". No entanto, a grande inovação (tecnológica) deste jardim será a inclusão de equipamentos interactivos ligados à música.
Em Odivelas existem mais árvores do que muitas vezes se pensa e se afirma - como os leitores habituais deste espaço bem sabem. No entanto, é notória a falta de um espaço verde com dimensões consideráveis, que possa funcionar como um ponto de referência e de descompressão numa cidade algo tensa e com o conhecido problema da má imagem que transmite para o exterior.
Paralelamente, ainda há poucos meses defendi, no "post" Ainda em torno do Centro Histórico (21.08.2009), que a vida de rua que ainda existe em Odivelas (algo cada vez mais raro nas nossas cidades, infelizmente) pode, e deve, ser canalizada para o Centro Histórico. E que esse centro pode ser um dos espaços mais espectaculares da Grande Lisboa, pelo património (secular) existente, pelo grande sentido urbano do Largo D. Dinis e também pelas potencialidades que encerra o citado vazio urbano.
O Jardim da Música, de acordo com o que é possível vislumbrar através do artigo da revista Arquitecturas, é pois muito bem vindo. A obra deverá arrancar em 2008, para inaugurar em 2009.

08 outubro 2007

Abriu a época da caça


Abriu a época da caça às ... "borboletas". As Redes Energéticas Nacionais (REN) enfrentam os poderes judicial e popular. Um tema importante para Odivelas, a seguir com muita atenção. Eis os desenvolvimentos mais recentes (em actualização):

Almada: Assembleia Municipal unânime contra afectação de terrenos municipais à REN (RTP, 20.12.2007)
REN vai desligar linha de muita alta tensão Fanhões-Trajouce (Público, 18.12.2007)
Cidadãos protestam contra linha de muito alta tensão em Almada (TSF Online, 12.12.2007)
Linha de alta tensão entre Tunes e Portimão vai ter traçado alternativo (Público, 07.12.2007)
Perto de 150 pessoas manifestaram-se junto ao Parlamento contra as linhas de alta tensão (Público, 24.10.2007)
Acção principal contra linhas de muito alta tensão tem início hoje no tribunal de Sintra (Público, 19.10.2007)
Penedos garante que “não há riscos para a saúde” (Jornal de Negócios Online, 08.10.2007)
REN recebe representantes da população em protesto contra linha de muito alta tensão (Público, 04.10.2007)
REN não vai desligar para já linha de muito alta tensão (TSF Online, 04.10.2007)
População do concelho de Silves protesta contra linhas de Muito Alta Tensão (TSF Online, 04.10.2007)
REN emite comunicado sobre "Exposição da População aos Campos Electromagnéticos" (03.10.2007)
Tribunal manda desligar linha de alta tensão em Sintra (TSF Online, 02.10.2007)
Sintra: REN vai recorrer da decisão do Supremo de desligar linha de muito alta tensão (Público, 02.10.2007)
REN em "Visto da Economia", por Helena Garrido