06 abril 2007

Um concelho sem rumo? (III)

Antes do périplo pela Cidade Radiosa de Odivelas, gostava de terminar a trilogia "Um concelho sem rumo?" (ver também partes I e II) com uma breve reflexão em torno da intenção, já assumida pela Câmara Municipal de Odivelas, de desenvolver um pólo universitário no respectivo concelho.
Todo o folclore que tem vindo a público nas últimas semanas em torno da Universidade Independente (que ocupa um belo edifício modernista, aproveito a passagem) tem como causa profunda o grande problema que o ensino superior, quer público quer privado, enfrenta em Portugal neste novo século: a falta de alunos.
A questão é fundamentalmente demográfica (envelhecimento da população) mas existem outros factores que contribuem para a crescente escassez de procura por cursos superiores. O elevado abandono no 10.º ano, que leva muitos jovens a não concluírem o ensino secundário, também tem a sua quota parte de culpa, bem como o desinteresse de muitos (a maioria?) jovens e adultos em aprenderem ao longo da vida, nomeadamente, investindo em formação e educação, tão encafuados que andam, ou com os bares e as discotecas, ou com as contas para pagar no fim do mês. E há ainda a qualidade, em geral, sofrível do nosso ensino superior e da associada investigação, bem como os "esquemas" e as "invejas" que caracterizam o meio universitário, que têm como consequência, por um lado, a fuga dos melhores alunos para o estrangeiro (os "cérebros", como habitualmente são designados pela imprensa) e, por outro lado, a quase completa incapacidade do País em atrair estudantes, nomeadamente de pós-graduação, do mundo avançado e evoluído.
No ano lectivo em curso ainda se tentou o estratagema da entrada de alunos com mais de 23 anos e não necessariamente com o 12.º ano mas, apesar de o balanço dessa operação só se poder fazer daqui a uns anos, parece-me que a falta de alunos não se vai resolver com este tipo de diligência. O problema é incontornável e só as melhores instituições e os melhores cursos e/ou os que garantem melhores níveis de empregabilidade sobreviverão a médio e longo prazo.
Uma evolução profunda vai ter que ocorrer nos próximos anos, nomeadamente, no ensino superior privado que, por ser mais jovem e menos prestigiado, tem mais dificuldade em se aguentar acima da linha de água.
Uma saída possível poderá passar pelo investimento em novas instalações e equipamentos que cativem públicos habitualmente pouco atraídos pelo ensino superior privado. Instalações, por exemplo, com alojamento ou com salas de aula, laboratórios, ateliers, oficinas e gabinetes para os docentes do melhor que existe em Portugal. É que importa atrair não apenas alunos mas também os melhores docentes (por que não estrangeiros), sendo essencial dar-lhes condições de trabalho acima da média praticada pelo ensino superior público.
De facto, a maioria das universidades privadas que operam em Lisboa ocupam instalações, em geral, bem localizadas mas vetustas e mal adaptadas aos fins a que se destinam. Os exemplos são conhecidos do grande público e dispensam apresentações. Ora, essas instalações são, contudo, muito valiosas devido à sua centralidade e/ou valor patrimonial. Podem ser adaptadas facilmente a outros usos, por exemplo, habitação de luxo ou equipamentos hoteleiros. A sua colocação no mercado imobiliário não seria muito difícil e geraria um importante encaixe financeiro, que poderia suportar o investimento em instalações modernas e arejadas, na coroa mais periférica ou mesmo suburbana da Cidade de Lisboa, capaz de sustentar um salto qualitativo do ensino superior privado que o tornasse verdadeiramente concorrente do ensino superior público.
Foi dado recentemente um sinal de que esta pode ser a tendência: o ISLA vendeu as suas instalações na Lapa e mudou-se para Carnide, ocupando uma velha quinta magnificamente reabilitada. A proximidade do Metro e do Centro Colombo não terá sido, certamente, ignorada.
Ora, Odivelas tem também Metro e um grande centro comercial. Tem a CRIL e a CREL, quando se sabe que há cada vez mais estudantes do ensino superior a deslocarem-se de carro (basta passar no Campo Grande ao fim do dia para constatar essa realidade). Odivelas tem ainda algum solo livre. E tem tradição na instalação de instituições de ensino e formação (ISCE, Escola Profissional Agrícola D. Dinis, Centro de Formação Profissional para o Sector Alimentar, entre outras).
Por isso, parece-me que faz algum sentido desenvolver um pólo universitário em Odivelas - bem mais do que a instalação de empresas de elevada incorporação tecnológica, apesar do desenvolvimento de um pólo universitário poder potenciar, a médio prazo e se associado a uma vertente tecnológica, a localização desse tipo de actividades económicas.